[ Coração Habitado ]

Aqui estão as mãos.
São os mais belos sinais da terra.
Os anjos nascem aqui:
frescos, matinais, quase de orvalho,
de coração alegre e povoado.

Ponho nelas a minha boca,
respiro o sangue, o seu rumor branco,
aqueço-as por dentro, abandonadas
nas minhas, as pequenas mãos do mundo.

Alguns pensam
que são as mãos de deus,
- eu sei que são as mãos de um homem,
trémulas barcaças onde a água,
a tristeza e as quatro estações
penetram, indiferentemente.

Não lhes toquem: são amor e bondade.
Mais ainda: cheiram a madressilva.
São o primeiro homem, a primeira mulher.
E amanhece.

in Até Amanhã
de Eugénio de Andrade


17.4.09

Mistério [ Filho ] | Galo








A lenda do Galo de Barcelos, conta a história de um peregrino galego, que de passagem por Barcelos, a caminho de Santiago de Compostela, foi acusado de ter cometido um furto. As autoridades resolveram prendê-lo, apesar dos seus juramentos de inocência.
Condenado à forca, o homem pediu que o levassem à presença do juiz que o condenara. Concedida a sua última vontade, levaram-no à residência do magistrado, que nesse momento se banqueteava com os amigos. O peregrino voltou a afirmar a sua inocência e, perante a incredulidade dos presentes, apontou para um galo assado que estava sobre a mesa e exclamou: -É tão certo eu estar inocente, como certo é esse galo cantar quando me enforcarem!
Gargalhadas e risos foram a reacção que obteve, mas pelo sim e pelo não, ninguém tocou no galo. Quando o peregrino estava a ser enforcado, o galo assado ergueu-se na mesa e cantou. Compreendendo o seu erro, o juiz correu para a forca e descobriu que o peregrino se salvara graças a um nó mal feito. O peregrino foi imediatamente liberto e mandado em paz.
Alguns anos mais tarde, o peregrino teria voltado a Barcelos para esculpir o Cruzeiro do Senhor do Galo em louvor à Virgem Maria e a São Tiago, monumento que se encontra no Museu Arqueológico de Barcelos, situado no Paço dos Condes de Barcelos.