[ Coração Habitado ]

Aqui estão as mãos.
São os mais belos sinais da terra.
Os anjos nascem aqui:
frescos, matinais, quase de orvalho,
de coração alegre e povoado.

Ponho nelas a minha boca,
respiro o sangue, o seu rumor branco,
aqueço-as por dentro, abandonadas
nas minhas, as pequenas mãos do mundo.

Alguns pensam
que são as mãos de deus,
- eu sei que são as mãos de um homem,
trémulas barcaças onde a água,
a tristeza e as quatro estações
penetram, indiferentemente.

Não lhes toquem: são amor e bondade.
Mais ainda: cheiram a madressilva.
São o primeiro homem, a primeira mulher.
E amanhece.

in Até Amanhã
de Eugénio de Andrade


14.4.09

Inês Sobreira













"Construir uma peça, juntar diferentes elementos, destacá-los ou escondê-los, dar-lhes preciosidade, é o que pretendo quando pego numa agulha, fio e começo a tecer as minhas peças. Valorizo a cor, o ritmo, os pormenores, o contraste do brilho da prata na borracha, a flexibilidade das estruturas que se adaptam ás formas do corpo. As peças vivem no e para o corpo e só aí é que as considero prontas."
Inês Sobreira